sexta-feira, 28 de março de 2014

Provas de vida


Nado livre às seis da manhã.
Travesseiro despertando às dez.
Banho quente.
Beijo ardente.
Gargalhada.
Tenra idade.
Abraço de graça.
Feijão novinho.
Papel e caneta.
Choro de emoção.
Livro de cabeceira.
Viagem sem eira nem beira.
Copo d´água gelada.
Cachorro no pé da cama.
Ombro pra recostar.
Taça de vinho fazendo tintim.
Pedido de casamento terminando em sim.
Cheiro de café.
Pergunta de criança.
Pé descalço.
Porta-retrato.
Paparico.
Uma noite acesa de amor.
Dias inteiros pela frente.
Música pra ouvir.
Sol pra iluminar.
Chão pra caminhar.

O que mais faz você se sentir vivo?
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sexta-feira, 21 de março de 2014

Fim


E aí alguém que você amava muito já não está mais aqui. De carne e osso. De vento em popa. De braços abertos para um abraço, um café, um sorriso largo. E aí você gruda na falta, feito Super Bonder. Que de super não tem nada. Cola dor, lágrima, cola o pé no asfalto quente, cheio de cacos de vidro. 50 graus e está frio, gelado, ferido, dureza de vida sem ele ou sem ela, pedaço imenso de você que também se foi, emoção que não se nomeia.
E aí você acha que não vai dar conta. Volta no passado e se lembra de tudo o que poderia ter feito e não fez. De tudo o que poderia ter dito e não disse. De tudo o que poderia ter sido e não foi. Oi. Tchau. Te amo. Adoro sua companhia. Durmo pensando em você. Meu porto seguro. Meu colo. Meu pai. Minha mãe. Meu tudo.
E aí você pega o chicote e bate. Forte. Dói. Mói. Mais feridas, só que agora no corpo inteiro. No coração morrendo de sede. Na alma em estado de sítio, greve de fome.
E aí alguém te diz para largar o chicote e trocar por flor; que na verdade, o grande requisito para a culpa é o amor. Que se você soubesse, se você pudesse, se tivesse constantemente os olhos pra dentro, ia fazer diferente. Mas não é Deus, esqueceu? Fez o que deu conta de fazer, querido(a) ser humano de carne e osso.
Quando você volta o olhar para o amor, você deixa a dor. E a culpa vai ficando pequena, serena, feito grão de arroz.
O que não foi não foi. Mas a essência do que é para sempre será. Não importa quanto tempo passe e com que força a saudade bata na porta, arrombando a alma, ainda há o amor, esse gentil escritor, para continuar a história.

sexta-feira, 14 de março de 2014

Namoro de longa data


Pegou o primeiro voo, cruzou o oceano, aterrissou cidadã do mundo.
Na bagagem, nada muito além do básico: luvas, algumas mudas, camisola, cachecol, perfume, saudade, bombom de licor, livro de cabeceira.
Do aeroporto à estação de trem, 20 minutos. Da estação ao destino tão esperado, trem-bala, que é pra chegar mais rápido.
Coração acelerado, cabeça a mil por hora, imaginação fértil delimitando cada cena. Divinamente encenada a sua temporada de música, vinho, poema e outono em Salzburg. Última parada, Estação dos Alpes, tocata de Mozart, taquicardia. Ardia de emoção, sorria por dentro, derramava alegria.
Olhando pela janela, procurava ansiosa. Encontro marcado há tempos, melhor abraço do mundo, acontecimento importante.
Ela, pianista. Ele, violoncelista.
Ela, silêncio. Ele, palavra.
Ela, mergulho. Ele, asa-delta.
Ela, carta. Ele, selo.
Ela, vertigem. Ele, conselho.
Ela, varanda. Ele, rede.
Ela, sina. Ele, sinfonia.
Ela, namorada. Ele, namorado.
Tão diferentes. Tão iguais.
Tão juntos. Tão duo. Tão sempre.
Passado, futuro, presente.
Casados há mais de 20 anos.

quinta-feira, 6 de março de 2014

Março


Noite escura.
Fez sol.
Encontro iluminado.
Fez sentido.
Grandeza de alegria.
Amor de sinfonia.
Contração de coração.
Fez festa dentro de mim.
Silêncio no hospital.
Emoção dilatada.
Duo de piano e violino começou a tocar.
Tocou a alma.
Sinos ressoaram.
Sina mais linda inventei de viver.
Olhos cheios d’água.
Águas de março.
Nasceu você.


* Retirado do livro Refúgio, Renata Feldman, Editora Asa de Papel, 2013.