domingo, 27 de fevereiro de 2011

Par ou ímpar

Se tem uma coisa que filho pequeno adora é dormir na cama dos pais. Eles vão chegando, se enroscando, fazendo do nosso amor o melhor cobertor que existe.
A psicologia recomenda que cada um vá dormir na sua cama. A fisiologia da nossa coluna vertebral recomenda o mesmo. Mas os moles dos pais e mães muitas vezes não resistem à tentação de aconchegar os filhos e adormecer com eles, zelando o seu sono e desfazendo qualquer medo de escuro.
Tá bom, tá bom. Cada um tem a sua cama, e tem que aprender isso desde cedo. Mas uma tentaçãozinha de vez em quando não faz mal nenhum. Ainda mais porque eles crescem rápido demais, e um dia não vão caber mesmo na sua cama. E pra falar a verdade, não tem nada melhor que ouvir a respiração deles à noite e ficar vendo-os dormir, tenra expressão de anjo adormecido.
Dia desses o Dé estava viajando e quase deu briga lá em casa. O Léo queria dormir comigo. A Bella também. Para evitar maiores desgastes e resolver a coisa numa boa, disse pra eles tirarem par ou ímpar. Tive que ensinar pra pequena como é que se faz isso, que tem que esconder a mão pra trás, colocar quantos dedinhos quiser, etc.
Na hora h, os dois já posicionados, perguntei a ela:
- Bella, você quer par ou ímpar?
E ela, com a voz mais dengosa do mundo:
- Eu quero ganhar!...

sábado, 26 de fevereiro de 2011

Etiqueta emocional

Homem não chora.
Mulher chora. (Mas de preferência dentro do banheiro. Ou se for em público, inventa um cisco.)
Perder a paciência não pode.
Fazer o jogo do contente pode.
Cantar mais alto que o i-pod no meio da rua não pode.
Dançar com a vassoura pode.
(Se ninguém estiver vendo.)
Pedir pra namorar é loucura.
Quem falou que dor de amor não tem cura?
Abraço apertado, exagero.
Abraço de tapinha, mentirinha.
Ter que agradar todo mundo, ditadura.
Beijo no cinema, gostosura.
Etiqueta emocional? Tesoura.

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Mais ou menos

Mais um dia de chuva.
Menos um dia de sol.
Mais um dia corrido.
Menos um dia de calmaria.
Mais um dia de silêncio.
Menos um dia de música.
Mais um dia de cama.
Menos um dia de grama.
Mais um dia árido.
Menos um dia florido.
Mais dia menos dia. 

terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Raio-X

Alegre. Triste. Perdido. Sem rumo. Radiante. Vazio. Cheio. Com medo. Sem esperança. Alheio. Adrenalina correndo nas veias. Com fome. Com frio. Boca seca. Amargo. Doce. Tranquilo. Frio. Querendo. Sentindo. Correndo. Distante. Perto. Cansado. Sem forças. Com energia para dar a volta ao mundo. Imundo. Limpo. Determinado. Confuso. Feliz da vida. Brigado com Deus. Falta de amor. Excesso de dor. Abatido. Serelepe. Impossível. Sapeca. Aventureiro. Temeroso. Guerreiro. Carente. A mil por hora. Clone de tartaruga. De pé. Deitado. Motivado. Ancorado. Cheio de entusiasmo. Zero de animação.
Se existisse um raio-x emocional, retrato de como anda o coração,  e você fizesse agora, nesse minuto esse exame, o que ia aparecer?
Como você se sente?

domingo, 13 de fevereiro de 2011

Chiclete

Cena cotidiana: a Bella tomando banho, enchendo de shampoo o cabelo da boneca, e eu tirando esmalte da unha. Papo vem, papo vai, faço aquela clássica perguntinha que os adultos adoram fazer às crianças:
- Bella, o que você vai ser quando crescer?
- Eu vou ser... muito grande, pra poder comer chiclete!
(...)

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Gota d´água

Chora, menina. Tira a poeira dessa alma seca.
Seca de amor, cheia de dissabor.
O passado já doeu muito, mas passou.
O inverno já não é mais frio, faz calor.
Reinventa o tempo, brinca de roda,
Cria uma energia nova no seu redor.

Chora pra molhar o seu jardim.
Mata a sede das flores.
Derrama vida no seu quintal.

Ainda está em tempo, vai arar a terra,
plantar sementes,
Ver a vida acontecer além do jornal.

Chora, menina. Deixa lavar a alma,
Alivia o peso, faz chover amor,
Enxuga a dor que te faz tão mal.

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Carpe diem

Quer um pouco de água com açúcar?
Eu não.
Fogo lento, banho-maria?
Não.
Cotovelo na janela esperando o tempo passar?
Nem pensar.
Eu quero é abraçar a vida, carpediar o que posso
(e o que não posso invento),
apimentar esse arroz com feijão.
Tira esse bege, bota um vermelho,
pinta as unhas de azul.
Faz uma serenata, salta de pára-quedas,
troca a gravata pelo picnic.
Pinica toda de grama, vai no bota-fora do sol,
enche de isca o anzol.
Sacoleja, sacode a poeira,
vai se apaixonar enquanto é tempo.
Eu carpedio, tu carpedias, ele carpedia,
nós carpediamos, eles carpediam.
Carpediou?

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

"Não se afobe não"

"Agora." "Rápido." "Pra antes de ontem cedo." "Now." "É pra já."
Os publicitários conhecem estas frases tintim por tintim. Sabem bem o que é varar a noite, engolir sanduíche no horário do almoço, cochilar de madrugada no sofazinho preto da recepção.
Mas não é só publicitário que é expert no assunto. Você, diante desse computador, consegue tudo o que quiser num clique. Basta acessar o google e o mundo está nas suas mãos. Bula de remédio, pizza delivery, flores para a mulher amada, dietas do sol e da lua, as últimas pesquisas da NASA, blog da Renata Feldman. Simples assim: digita, deleta, clica, desliga.
O mundo está ficando cada vez mais rápido, acelerado, imediatista.
Mas cuidado, caro ser humano de carne e osso,  com um coração batendo aí no peito. Nem tudo é pra antes de ontem cedo. Seus desejos, suas culpas, seus sonhos e pulgas atrás da orelha, tudo isso tem um tempo próprio de acontecer ou se desfazer. A vida é feita de processos, muitas vezes lentos e silenciosos.
Para aplacar sua angústia, liga o Chico Buarque naquela música linda da qual eu só me recordo a estrofe: "Não se afobe não, que nada é pra já... O amor não tem pressa, ele pode esperar em silêncio num fundo de armário, na posta-restante milênios, milênios no ar."