segunda-feira, 27 de maio de 2013

Perolices edificantes


Na volta da escola, vou entrando no mundinho da Bella,
perguntando como foi seu dia:
- Então, minha flor, o que você aprendeu hoje?
- Aprendi a ter dúvidas!
É. Dá-lhe Sócrates, "só sei que nada sei".
................................................

Comentário do Léo no final do domingo:
- Mãe, você sabia que a vovó bebe?
- É, de vez em quando ela toma uma cervejinha...
Por que a surpresa, meu filho?
- É que ela não é adulta, é idosa...
.................................................

Bella empolgada para ir ao sítio:
- Ai, eu tô tão feliz!
- Por que, Bebella?
- Por que eu vou ver minha cachorrinha, a Teca.
Ela ficou ENGRAVIDADA!
.................................................

quinta-feira, 23 de maio de 2013

Engano


Por engano dois bebês são trocados
logo após o nascimento.
Por engano, susto, pânico eles se misturam no refúgio,
nascidos que foram em meio ao bombardeio.
O menino israelense ganha o colo da mãe palestina.
O menino palestino ganha o colo da mãe judia.
Os meninos crescem, a verdade aparece
com a força de uma granada.
Apesar das diferenças tão abissais e gritantes,
os dois filhos se encontram.
As duas famílias se reúnem para jantar.
Os olhares se cruzam.
Os lábios entoam uma canção familiar.
As raízes se ampliam.
As fotografias falam.
A tocante ficção de "O Filho do Outro"
é vida real na história de algumas vidas.
Por engano se cometem erros,
desastres, equívocos sem fim.
Por pertencimento rompem-se barreiras,
desfazem-se mal-entendidos,
se desmancha um muro inteiro.
A sensação de pertencer a uma família, uma pátria,
uma barriga ou a um time de futebol
fica desde sempre registrada
na alma, no sangue, na carne.
Impressão digital, profundamente emocional,
que guerra nenhuma jamais apaga.

quarta-feira, 15 de maio de 2013

Diante do muro


É de pedra, emoção, tijolo e terra o meu lamento.
Pelas mulheres que não podem rezar.
Pelos homens que desaprenderam a amar.
Pelas crianças esquecidas.
Pelo adoecer repentino.
Pelos encontros tão doídos.
Pelo diálogo surdo.
Pela polêmica vazia.
Congresso de azia.
Pelo grito mudo.
Vida no escuro.
Rua sem lua.
Pelo amor de Deus, que lê os bilhetes do mundo.
É de letra, luz, rascunho e rima o meu intento.

quinta-feira, 2 de maio de 2013

Rotina


"Um, dois, feijão com arroz."
Fez onde, esse curso de robô?
Roubou seu tempo, economizou conversa jogada fora,
suas estrelas deixou de contar.
Toca o despertador. Começa o noticiário.
Árido o dia que termina assim.
Tão no automático.
No imediático, se é que existe palavra assim.
Brinca de parar o tempo, menino.
Tanta coisa pra fazer, alma trancada no sótão.
Sai da catatonia, fura a monotonia
como surfista quebrando onda.
Vai morrer de amor mas não morre na praia.
Sai do padrão, faz careta pra escuridão,
acende os olhos para não perder de vista
a paixão que há tempos te ronda.
Compra logo uma lanterna roxa e sai por aí.
Vai bater ponto na vida.
Faz serenata, essa coisa tão antiga.
Vai contar causos de pescaria.
Tricotar com a avó.
Ou teclar, bater um blá, sei lá.
Acende uma lareira e junta os amigos.
Dá férias pro chefe e prepara panqueca de abacate
com pimenta rosa.
Mas troca essa voz robótica,
esse jeito previsível de fazer tudo igual sempre.
Desde sempre é que não foi. Foi?
Desrobotiza. Miraculiza. Externiza.
Xis. Sorria.
Você não está sendo filmado.