segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Ansiedade infantil

Interessante como a noção de tempo se desenrola na cabecinha de uma criança.
Domingo lá pro meio da tarde, depois do peixe ao molho de camarão divinamente preparado pelo pai,
o sofá nos chamando prum filme da Disney, a pituquinha me vem com essa:
- Mãe, hoje tem aula?
(...)
Não é raro dizer também:
- Ontem eu vou brincar com a minha amiga Sofia de Barbie Moda e Magia!...
(...)
À falta de noção, tão apropriada pra idade, soma-se à ansiedade de sorver com empolgação
cada segundo da vida, como se ela fosse um sorvete gigante banhado por uma deliciosa calda de chocolate.
Daí a famosa e incessante perguntinha que sempre acompanha as viagens de carro:
- Tá chegando? Tá chegando? Já chegou?
(...)
Quando é o aniversário que está chegando, então, a ansiedade escorre.
Nessas manhãs "agradavelmente" despertadas uma hora mais cedo pelo famigerado horário de verão,
a Bella mais parecia aquela personagem dos contos de fadas que leva o seu nome, tal era a profundidade do seu sono.
Fiquei com dó, levei o Léo primeiro pra aula (afinal, tinha uma baita prova de matemática esperando por ele) e fui trabalhar.
Fiquei sabendo mais tarde pelo Dé que, quando foi acordar a Bella Adormecida, ela abriu os olhos e perguntou:
- Hoje é meu aniversário?
- Não, filha. Ainda faltam alguns dias.
- Ah, então eu vou dormir mais um pouquinho.
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terça-feira, 25 de outubro de 2011

Perolices

Aniversário na escola das crianças. Depois do parabéns, o tradicional “Com quem será, com quem será, com quem será que a Marili vai casar... É com o Thiago, é com o Thiago, é com o Thiago que a Marili vai casar...”
Até aí, tudo bem.
O inesperado foi o Léo questionar, em alto e bom som, na maior braveza, dando a maior bandeira:
- QUEM É ESSE THIAGO?
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Dias depois, o Léo foi acampar na casa do João. Adivinha de quem o João é irmão? Da Marili, a lindinha de olhos azuis "que vai casar com o Thiago". Pois é. Com a bandeira que o meu filho deu, a mãe da Marili (também psicóloga e escritora, poetisa de mão cheia) ficou na maior torcida. Aprovação total do pequeno futuro genro.
Eis que na hora do almoço, como quem não quer nada, a avó da Marili, também já botando fé, perguntou:
- Quando você crescer, Léo, vai se casar com uma judia ou uma cristã?
Com uma tromba de todo tamanho, ele respondeu:
- Eu não vou casar. Vou ser padre.
(!)
- Ué, num é rabino não, é padre?...
- Não. Vou ser padre.
(Claro. Rabino casa. Padre de jeito nenhum.)
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Toda noite, rezo com as crianças. Costumo dizer algumas palavras e peço a eles pra repetirem.
Um dia desses falei pra Bella:
- Hoje você vai rezar sozinha, Bella. O que você gostaria de falar pro papai do céu?
- Que eu amo o Léo!...

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Verdade ou mentira?

Às vezes fica tão fácil complicar a vida. Fica fácil colocar pedras no meio do caminho, por mais pesadas que elas sejam. Fica fácil trocar o sim pelo não. Colocar máscara de velho rabugento pra disfarçar a criança que tem aí dentro, estendendo os braços, pedindo colo. Sim. Colo, abraço, cheiro, afeto. Já ouviu falar nisso? Mas não. É mais fácil torcer o nariz, obedecer cegamente o relógio, ignorar a beleza que reside na simplicidade de um oi, um obrigado, um adeus. Filhos separados dos pais, retratos rasgados de uma história que poderia ser mas não foi. Amores que se foram, se perderam, para sempre, sem volta. Amigos que há muito guardam esse título, mas se tornaram apenas velhos conhecidos, esbarrando ocasionalmente no supermercado. Prateleiras cheias de hipocrisia, má-digestão, azia. Falta de tempo, falta de paciência, falta de coragem de olhar o outro nos olhos e perguntar: "Você está bem?" De verdade, por querer saber, interesse genuíno, e não porque o protocolo exige. Talvez esteja passando da hora de romper alguns estranhos hábitos. Girar a garrafa, tirar o disface, abandonar máscaras. Abraço de urso, ao invés de tapinha nas costas. Conversa de horas, ao invés do bom dia de elevador."Eu te amo" dito sem dizer absolutamente nada e dizendo absolutamente tudo. Verdade verdadeira, essa que a gente capta num olhar, num sorriso, num telefonema mesmo que rápido, na frieza de uma tela de computador.
Qual é a sua verdade?

domingo, 9 de outubro de 2011

Pânico

Sexta-feira levei um susto danado, desses que inundam o organismo de adrenalina e alteram a pressão arterial.
Estava fechando o consultório quando recebi uma ligação da Patrícia, minha ajudante, em pânico:
- O Léo estava tomando banho e o box caiu em cima dele! Voou caco de vidro pra todo lado e ele teve vários cortes, mas parece que não foi nada grave.
Sua mãe e seu pai saíram daqui agora, foram levar ele pro hospital.

[Ai. Respira fundo, reza e aperta o passo.]
(...)
Graças a Deus tudo não passou de alguns cortes superficiais, o pior mesmo foi o susto e o tanto que o pequeno berrou.
Tinha caco de vidro até dentro da orelha, mas nem ponto precisou dar.
Nada como vô e vó sempre por perto, de prontidão, e um anjo da guarda que não arrasta pé nem um segundo, sempre em vigília e proteção.
Nada como carinho de pai e mãe pra passar o susto e aliviar a dor.
Curativos feitos e muitos decibéis de choro por causa do iodo ardido, fomos comer uma pizza pra relaxar.
A essa altura o Léo já estava com a carinha ótima, saboreando a sua pizza preferida e recontando a história algumas dezenas de vezes.
Eu ainda estava perplexa:
- Meu Deus, nunca ouvi contar um caso desses. O blindex estourar desse jeito, que loucura...
E aí é que ele me veio com mais uma das suas:
- Tá vendo, mãe? Por isso é que eu não gosto de tomar banho!
(!...)

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Perolices fecundas

Ontem o almoço lá em casa foi a maior "Disneylândia": frango a passarinho crocante, purê de abóbora moranga, saladinha de mil folhas.
À noite, a Bella me pediu para contar uma história e a escolhida foi "A leiteira".
Muito curiosa e conversadeira, a pequena me interrompia a cada palavra lida para perguntar
"que que é isso?", "por que aquilo?"
Em determinado momento da história, "A leiteira" foi ao mercado para comprar uma galinha poedeira, e a ilustração mostrava justamente
os ovos sendo quebrados pelos pintinhos.
Foi quando apontei pra galinha e disse a ela:
- Olha, filha, igual o frango que a gente comeu na hora do almoço.
Qual não foi o seu espanto, desgosto, perplexidade. Parecia o fim do mundo:
- O quê, mãe?!?!? A gente comeu frango?!?!?!
(...)
Coitado!...

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E o Léo aprendendo tudo (e me ensinando tudo) sobre o Ano Novo Judaico, a criação do mundo, etc:
- Foi assim que tudo começou, mãe. Deus criou a terra, o céu, o mar, as plantas e os animais, criou o homem e a mulher.
- Quanta coisa linda ele criou, né, Léo?
E ele, pensativo:
- E quem foi que criou Deus?!?!?!?

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segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Abstinência

Passo mal
se não escrevo.
Sinto dores,
calafrios, ausências.
Sinto saudade de mim.