quarta-feira, 10 de abril de 2013

Falta


A história você já conhece:
a gente nasce, cresce, envelhece e morre um dia.
(Não necessariamente nesta ordem.)
Mas o tal do morrer assusta,
por mais "natural" que seja.
É que o "natural" também passa
pelo forte impacto do factual,
da concretude da perda, do fim mais finito.
Quem parte vai virar etéreo, anjo, estrela,
na melhor explicação que costuma se dar às crianças.
Quem fica precisa se acostumar com a presença
doída, moída, torturante de uma ausência
que não estava no script,
apesar de lá estar desde sempre.
Por mais rezas e velas acesas,
somos acostumados ao material.
Somos afetivamente,
emocionalmente materialistas por natureza.
O telefone que toca. O colo que acolhe.
A voz que pergunta como foi o dia.
O comprimido, a alergia, a mudança de tempo.
Os pés entrelaçados na cama.
O perfume, o toque, o braço que abraça.
O termômetro que atesta a febre,
o copo de leite, a roupa cheirando à amaciante,
o fio de cabelo no travesseiro.
As gavetas, o criado-mudo, o prato predileto,
a risada inconfundível.
O controle-remoto, o Jornal Nacional,
o sofá agora imenso.
As manias, os sapatos, a cabeceira vazia.
E aí vem a missa de sétimo, vigésimo, milésimo dia.
Só o tempo para serenar a dor
e acalmar esse mar revolto
que um dia quase afundou seus olhos.
Quem se foi nunca precisou ter ido, essa é a verdade.
Quem se foi jamais se vai.
Vira estrela dentro da gente,
pulsando no coração há de eterno.
Tão dentro, tão perto, tão luz, tão sempre.
Saudade muda de nome, perde o sentido, perde o rumo.
Saudade a gente sente de quem está longe.

2 comentários:

  1. Bom dia, querida Renata!

    Como vc tem sempre o alvo certeiro em meu coração.Coração? Não, é pouco, alma tb. Perdi meu pai há um ano e minha mãezinha sofrendo com o mal de Alzheimer, já a estou perdendo por algum tempo...como dói...Não sei se concordo quando diz q o tempo ameniza a dor da perda, penso q ele nos ajuda a conviver com ela. No caso de meu pai o q fizemos p abrandar a saudade foi plantar um arbusto ao lado de sua lápide, náo só por ele ter sido um grande ecologista, mas tb uma tentativa de neutralizar a morte com a vida através de uma bela árvore!

    Bj grande, muito querida!

    Rita de Cássia

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  2. Rita querida,

    Quanta emoção no seu relato! Quanta verdade na sua dor!...
    Que esta bela árvore da vida possa oxigenar o coração e fortalecer cada vez mais o amor pelas suas raízes, minha querida!...
    Fico muito feliz pela sintonia de alma que conseguimos estabelecer por aqui.

    Um abraço carinhoso, cuide-se bem!...

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